O Fermento dos Fariseus
Luc. 12:1-2: “Acautelai-vos do fermento dos fariseus”. (V. também Gal 5:7-9; I Cor. 5:6-8).
Aqui Jesus nos faz uma advertência através da palavra “acautelai-vos”. Mas, por quê? O que Ele quis dizer com fermento?
O fermento, em sentido literal, é uma substância carregada de microorganismos, fungos e levedos, que, em contato com outras substâncias – massa de pão, sucos naturais, ou leite, – altera a composição natural desses alimentos, numa reação química chamada de fermentação.
A fermentação é uma reação silenciosa, vagarosa e progressiva, que pouco a pouco vai transformando a massa, alterando o seu sabor, a sua aparência e a sua composição. Modifica a massa silenciosamente. Pouco a pouco elimina a essência natural, dando novas propriedades e novas características à substância fermentada. Por fim, leveda, azeda.
Diz-se que, entre os judeus, o fermento constituía-se de uma massa velha em alto grau de fermentação, que, introduzida na massa fresca, provocava a fermentação. Por isso, de conhecimento popular a máxima segundo a qual “um pouco de fermento leveda toda a massa”.
A Páscoa entre os judeus era celebrada com pães asmos, ou seja, pães sem fermento (Deuteronômio 16.8). Num sentido figurado, entendemos que “pão” é a Palavra do Senhor, que alimenta a alma e o espírito de todo ser humano, despertando-lhe a fé e a esperança de vida eterna.
“Pães asmos” aponta para a Palavra de Deus oferecida de forma pura, sem a interferência dos “achismos” humanos.Jesus precisou advertir os discípulos, dizendo: “Acautelai-vos do fermento dos fariseus e saduceus” (Mt 16:6; Lc.12:1-7).
Os fariseus acreditavam que os jejuns, as esmolas, o batismo pelas águas e as confissões eram suficientes expiações pelos pecados. Os pensamentos e desejos não eram pecaminosos, a não ser que fossem postos em ação. Acreditavam na ressurreição e reconheciam que a alma é imortal. Eram legalistas rigorosos. Defendiam a rígida observância da letra e das formas da lei, mas, em geral, eram conhecidos pela sua cobiça, crueldade, justiça própria e hipocrisia.
Já os saduceus formavam um partido judaico que era tão político, quanto eclesiástico. Não acreditavam na ressurreição e na existência de anjos e espíritos e criam que as almas morriam com os corpos.
Os discípulos de Jesus, que O seguiam, tinham a visão de que a justiça ou retidão de vida era um requisito indispensável para se entrar no reino de Deus. Eles conheciam apenas a justiça segundo os fariseus. Jesus precisou adverti-los, dizendo: “Acautelai-vos do fermento dos fariseus e saduceus” (Mt 16:6), isto é, “tomem cuidado para não serem enganados com as suas doutrinas”.
O “fermento”, nesse sentido, nada mais é do que a interferência humana na interpretação da Palavra, dando-lhe outro aspecto. É a velha massa da hipocrisia, da malícia, do egoísmo, da demagogia e do interesse individual, característico de todo ser humano, interferindo na nova massa espiritual do pão que dá a vida, o Evangelho de Cristo. Fermento, aqui, é o que há de podre no ser humano, vestido de cores religiosas.
Fermentação fala de torcer o sentido do texto aqui, modificando ali, omitindo, invertendo, acrescentando, subtraindo, descontextualizando, procuram, com isto, justificar e dar embasamento bíblico a doutrinas tendenciosas, opiniões particulares, desejos e motivações puramente pessoais.
O “fermento” fala do uso da Palavra de Deus num contexto diferente da que foi proferida. É a manipulação da Palavra. O “fermento” é a enganação escondida atrás dos discursos piedosos.
Quando Jesus fala de “fermento dos fariseus”, na verdade, Ele está se referindo ao contingente humano que esses religiosos impregnaram na relação homem/Deus. Fermento não é o que aparenta. Não é o que se vê externamente. Mas é o veneno escondido. É a podridão por dentro do “sepulcro bem ornamentado”. Observe que Jesus aponta os fariseus como semelhantes aos “sepulcros caiados” (Mateus 23:27).
A Bíblia nos mostra que o homem pode usar um discurso nobre e aparentemente desinteressado para disfarçar intentos egoístas.
Assim, vemos Judas Iscariotes tentando disfarçar a sua cobiça com um discurso aparentemente altruísta: “Por que não se vendeu este ungüento por trezentos dinheiros e não se deu aos pobres? Ora ele disse isto, não pelo cuidado que tivesse dos pobres, mas porque era ladrão, e tinha a bolsa, e tirava o que ali se lançava.” (Jo 12.5-6)
Vemos Saul dar uma boa desculpa, quando questionado: “Pegamos o melhor do gado para sacrificar ao Senhor”. Satanás, para enganar, não conta grandes mentiras; ele apenas provoca um leve desvio da palavra verdadeira.
Hoje, o Evangelho está impregnado de acréscimos e omissões, mas temos como obrigação examinarmos as Escrituras, para que possamos sair da Babilônia, uma vez que nos foi deixada a seguinte ordem: “Sai dela, povo meu”.
Sabemos que as virgens loucas não estão fora da igreja, mas dentro dela. Todas são virgens, têm a candeia, mas apenas algumas tem o azeite, que é o Espírito de Deus, conduzindo-as na verdade. Já as demais querem guiar a verdade.
Quando Israel estava no deserto, houve um episódio interessante: homens questionaram o sacerdócio de Arão, e defendiam que todo o acampamento era santo. Sabemos, no entanto, qual foi o fim trágico desse episódio histórico: a terra se abriu e tragou 250 homens vivos.
Salomão já “achou” que, embora os israelitas fossem orientados a não se unir a um julgo desigual, ele jamais se deixaria contaminar. Porém, sabemos o que aconteceu: as mulheres, na sua velhice, mudaram-lhe o coração.
Tudo em razão dos achismos….
O profeta Isaías também se insurgiu contra a artificialidade e as formalidades que caracterizavam a religião dos seus dias: “Ouvi a palavra do Senhor, governadores de Sodoma; dai ouvidos à lei do nosso Deus, ó povo de Gomorra. De que me serve a mim a multidão de vossos sacrifícios? diz o Senhor. Estou farto dos holocaustos de carneiros, e da gordura de animais cevados; e não me agrado do sangue de novilhos, nem de cordeiros, nem de bodes. Quando vindes para comparecerdes perante mim, quem requereu de vós isto, que viésseis pisar os meus átrios? Não continueis a trazer ofertas vãs; o incenso é para mim abominação. As luas novas, os sábados, e a convocação de assembléias … não posso suportar a iniqüidade e o ajuntamento solene! As vossas luas novas, e as vossas festas fixas, a minha alma as aborrece; já me são pesadas; estou cansado de as sofrer. Quando estenderdes as vossas mãos, esconderei de vós os meus olhos; e ainda que multipliqueis as vossas orações, não as ouvirei; porque as vossas mãos estão cheias de sangue.
“Lavai-vos, purificai-vos; tirai de diante dos meus olhos a maldade dos vossos atos; cessai de fazer o mal; aprendei a fazer o bem; buscai a justiça, acabai com a opressão, fazei justiça ao órfão, defendei a causa da viúva.” (Is. 01.10-17).
“E assim invalidastes, pela vossa tradição, o mandamento de Deus” (Mt. 15.7).
O maior problema em relação ao “fermento” é sua ação secreta e sorrateira. Fica escondido no meio da massa, nos sentimentos, no mais íntimo do espírito, no inconsciente do indivíduo. Não tem aparência externa e não é perceptível claramente. Para detectá-lo, é necessário que se faça uma investigação minuciosa das verdadeiras intenções por detrás das “verdades” alardeadas sobre os púlpitos.
Outro problema é que fermento se propaga com enorme facilidade e poucos cristãos se dão ao trabalho de analisar, estudar e contestar as arbitrariedades. E menos ainda são os que estão dispostos a serem “queimados em praça pública”. Lembremos ainda que a palavra do Senhor é o pão que alimenta a alma e o espírito de todo aquele que crê.
Hoje se cumpre a palavra do profeta Amós, que apregoou: “Eis que vêm dias, diz o Senhor Jeová, em que enviarei fome sobre a terra, não fome de pão, nem sede de água, mas de ouvir as palavras do Senhor.” (Am. 8.11).
As pessoas têm muita fome da Palavra de Deus e buscam alimento em diversos lugares. O Evangelho de Cristo, como alimento espiritual, deve ser oferecido com muita pureza pela Igreja. O perigo está no fato de que o alimento oferecido por muitos evangélicos não é alimento puro; antes, é alimento contaminado com um fermento que pode fazer mal, indigestão, e até morte espiritual. O alimento contaminado, ao invés de alimentar, de fortalecer, de produzir cristãos vigorosos no amor, produz o fanático e intolerante, produz o fundamentalista, o legalista, o irracional e o rancoroso.
Não nos assustemos se o Evangelho desta forma anunciado não atingir o verdadeiro objetivo da Palavra de Deus, que é a libertação do cativo das mãos do pecado e do maligno. Ninguém terá vida saudável, ingerindo, cotidianamente, um alimento deteriorado.